Câmara aprova projeto que cria a Lei Geral do Esporte Esporte
Proposta foi alterada pelos deputados e retornará ao Senado para nova votação
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (6) o projeto que reformula a legislação esportiva, instituindo direitos para os atletas em formação e reunindo várias leis em um único diploma legal.
A chamada Lei Geral do Esporte foi aprovada na forma do substitutivo do relator, deputado Felipe Carreras (PSB-PE), para o Projeto de Lei 1153/19. A proposta teve origem no Senado e retornará para nova votação dos senadores.
Felipe Carreras afirmou que a proposta valoriza o esporte em todas as suas dimensões. “Hoje, o Congresso Nacional reconheceu a importância do esporte não apenas para a formação de campeões e medalhistas, mas para a formação de um cidadão. O esporte é uma ferramenta de inclusão social”, disse.
Carreras também declarou que a proposta torna os profissionais de educação física uma categoria essencial para a saúde e reconhece os profissionais que atuam nas mais diversas modalidades, como artes marciais e ioga. “São profissionais que atuam na saúde preventiva, como reconheceu a Organização Mundial de Saúde.”
De acordo com o texto, haverá mudanças também na distribuição da arrecadação de loterias de prognósticos (Mega-Sena, Quina e semelhantes). Do total que cabe ao órgão responsável pelo Esporte (atualmente a Secretaria Especial do Esporte do Ministério da Cidadania), o texto retira 1,13 ponto percentual para direcionar recursos às secretarias estaduais de Esporte, proporcionalmente às apostas feitas em seu território, para aplicação em modalidades olímpicas e paralímpicas de jogos escolares.
As secretarias ficarão com 1 ponto percentual a mais. O restante será dividido entre o Comitê Brasileiro do Esporte Master (CBEM), a Confederação Brasileira do Desporto Universitário (CBDU) e a União dos Esportes Brasileiros.
Na loteria por quota fixa, na qual os jogadores fazem apostas em resultados específicos de partidas, o texto retira 1 ponto percentual do lucro bruto das operadoras e destina o dinheiro às entidades do ciclo olímpico (Comitê Olímpico Brasileiro – COB e Comitê Paralímpico Brasileiro – CPB) e às entidades agregadoras de clubes (Comitê Brasileiro de Clubes – CBC, Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos – CBCP, Confederação Brasileira do Desporto Escolar – CBDE e Confederação Brasileira do Desporto Universitário – CBDU).
Dos clubes que cedem os direitos de uso de suas marcas e símbolos, o texto retira 0,1 ponto percentual para dividir os recursos entre os árbitros de futebol e a Federação das Associações de Atletas Profissionais (Faap).
Além disso, as operadoras das loterias por quota fixa sem sede no Brasil não poderão mais fazer publicidade no País.
Assistência a atletas
O texto do relator reinclui na legislação a cobrança dos clubes de parte dos salários e das receitas obtidas com transferência dos jogadores para financiar a Faap. Essa contribuição tinha sido extinta pela Lei 14.117/21.
Entretanto, o valor da contribuição incidente sobre os salários mensais será menor: 0,25% em vez dos 0,5% quando da vigência anterior.
Quanto à parcela incidente sobre as transferências nacionais e internacionais de jogadores, emenda do deputado Afonso Hamm (PP-RS) aprovada em Plenário passou para 1% a parcela devida à Faap pela entidade que vende o passe.
O texto exige da Faap a apresentação ao Poder Executivo, a cada dois anos, de suas demonstrações financeiras, junto com relatórios de auditoria externa independente sobre os gastos em programas assistenciais de transição de carreira do atleta profissional para sua recolocação no ambiente de trabalho.
Incentivos tributários
A permissão para empresas e pessoas físicas descontarem do Imposto de Renda devido valores aportados em projetos desportivos e paradesportivos, que terminaria em 2022, não terá mais data para acabar.
Carreras propõe ainda que as pessoas jurídicas possam descontar até 4% do imposto devido por meio das doações, contra o limite de 1% vigente. Essas empresas poderão deduzir os valores doados como despesa operacional a fim de reduzir a base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) a pagar. Atualmente, isso é proibido.
Para pessoas físicas, o limite passa de 6% para 7% do imposto devido.
Atletas em formação
Principal tema do projeto original do Senado, os direitos para atletas em formação procuram garantir assistência médica integral, transporte, alimentação e limitação do tempo de treino, embora alguns destes já constem da legislação. Confira os direitos listados no projeto aprovado:
- participação em programas de treinamento nas categorias de base;
- treinamento com corpo de profissionais especializados em formação técnico-desportiva;
- segurança nos locais de treinamento;
- assistência educacional, complementação educacional e auxílio com material didático-escolar;
- tempo, não superior a quatro horas diárias, para a efetiva atividade de formação do atleta;
- matrícula escolar;
- assistência psicológica, médica, odontológica, farmacêutica e fisioterapêutica;
- alimentação suficiente, saudável e adequada à faixa etária; e
- garantia de transporte adequado para o deslocamento de ida e volta entre sua residência e o local de treinamento.
A entidade formadora terá de proporcionar alojamento com instalações certificadas, assistência de monitor responsável durante todo o dia, convivência familiar e participação dos atletas em atividades culturais e de lazer nos horários livres.
Deverá haver um programa contínuo de orientação e de suporte contra o abuso e a exploração sexual com uma ouvidoria para receber denúncia de maus-tratos e exploração sexual.
O clube terá de apresentar ao Ministério Público estadual, anualmente, os laudos técnicos expedidos pelas autoridades competentes pela vistoria das condições de segurança dos locais.
Primeiro contrato
Em relação aos primeiros contratos especiais de trabalho esportivo com jovens a partir de 16 anos, o texto limita sua duração a três anos para a modalidade de futebol, deixando para as demais modalidades o limite de cinco anos como ocorre atualmente.
Nas situações em que o primeiro contrato ocorrer com entidade de prática esportiva internacional, o atleta que não pagar a multa prevista para a entidade formadora não poderá voltar a ser registrado desportivamente junto à federação no Brasil até quitar a indenização.
Multa rescisória
O substitutivo de Carreras diminui a multa a que o atleta profissional tem direito como indenização no caso de rescisão por falta de pagamento do salário, por rescisão indireta ou dispensa imotivada.
Em vez do limite mínimo atual, equivalente ao total de salários mensais a receber até a data fixada no contrato rescindido, o texto prevê o pagamento de metade desse valor, tanto na rescisão envolvendo atletas quanto naquela de técnicos de futebol. A exceção será para o contrato de até 12 meses, que continua com a regra atual (valor restante total).
Além disso, o valor a pagar será parcelado em prestações iguais e mensais até a data final do contrato originalmente pactuado.
No entanto, se durante o pagamento parcelado o atleta começar a receber por outro clube, a agremiação devedora da indenização ficará isenta de pagar o restante se o salário do novo clube for igual ou maior que o previsto no contrato rescindido. Se for menor, deverá ser paga apenas a diferença.
Gravidez e arbitragem
Os contratos com atletas mulheres não poderão prever qualquer tipo de condicionante relativa à gravidez, à licença-maternidade ou a questões sobre maternidade em geral.
Já em contratos com remuneração igual ou maior que duas vezes o teto do INSS (cerca de R$ 14 mil) poderá ser pactuada cláusula de uso de arbitragem.
Uma convenção ou acordo coletivo de trabalho disporá sobre a regulação do trabalho do atleta profissional, respeitadas as peculiaridades de cada modalidade esportiva e do trabalho das mulheres, assim como a proteção ao trabalho do menor de idade.
Adicional noturno
Nos contratos de jogadores de futebol, deverá ser pago adicional de 20% na hora quando o jogo ocorrer no período noturno, salvo condições mais benéficas previstas em convenção ou acordo coletivo.
Outra mudança é quanto ao direito de imagem do atleta se ele ceder esses direitos ao clube. Nessa situação, passa de 40% para 50% o montante da remuneração total que pode ser considerado pagamento por esses direitos.
Crimes de torcida
Em crimes que já constavam do Estatuto do Torcedor, o texto aprovado pelos deputados prevê a aplicação da pena de reclusão de 1 a 2 anos e multa para o torcedor que participar de brigas de torcidas. Atualmente, o estatuto lista apenas as ações de promover tumulto ou praticar violência perto dos estádios e portar objetos para praticar violência.
Essa pena será aumentada de 1/3 até a metade para aquele que organiza ou prepara o tumulto ou incita a sua prática. Outro agravante, que dobra a pena, será para o crime ligado a casos de racismo no esporte brasileiro ou se cometido contra as mulheres.
Cadastro de torcedor
Em vez de exigir cadastro apenas dos torcedores vinculados a torcidas organizadas, como prevê atualmente o Estatuto do Torcedor, o projeto exige isso de qualquer torcedor que vá a estádios de futebol. O cadastro será obrigatório apenas para os estádios com capacidade superior a 20 mil espectadores.
O cadastro será mantido pelo Executivo federal e implementado em parceria com estados, Distrito Federal e organizações esportivas da modalidade.
Controle de público
Outra medida de controle e fiscalização do acesso do público a arenas esportivas com capacidade para mais de 35 mil pessoas é o monitoramento por imagem das catracas, além de uma central técnica de informações para acompanhar as imagens.
As administradoras dos estádios terão quatro anos após a publicação da futura lei para implementar o sistema.
Justiça desportiva
O texto aprovado acaba com o Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) após um ano da futura lei, remetendo às entidades de administração de cada esporte a normatização de sua própria justiça esportiva.
Cada organização da Justiça esportiva deverá ser composta com paridade representativa entre as entidades de administração, os atletas, os treinadores, os árbitros, os clubes e a sociedade civil, representada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
O COB e o CPB deverão manter organização independente para instituir a Justiça Esportiva Antidopagem (JAD), com competência para julgar violações a regras antidopagem e aplicar as punições, além de homologar decisões de organismos internacionais relacionadas a violações de regras antidopagem.
Outros pontos
Confira outros pontos do texto aprovado pelos deputados:
– exclui os recursos destinados a patrocínios esportivos ou culturais do limite de despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais em ano eleitoral;
– cria as modalidades de bolsa-atleta para atletas-guia e para atleta aposentado que tenha conquistado medalha olímpica ou paralímpica;
– classifica jogos eletrônicos como desporto;
– para poderem receber recursos federais e de loterias, as entidades do Sistema Nacional do Esporte deverão garantir isonomia na premiação a atletas homens e mulheres nas competições que organizarem;
– essas entidades deverão garantir ainda a presença mínima de 30% de mulheres nos cargos de direção;
– professores de educação física terão exclusividade para ministrar a disciplina nas escolas;
– as atividades de profissional de educação física são classificadas como serviços públicos essenciais; e
– dispensa de chamamento público a parceria com organizações da sociedade civil para a execução de atividades vinculadas a serviços relacionados ao esporte.
Reportagem – Eduardo Piovesan e Carol Siqueira
Edição – Pierre Triboli
Fonte: Agência Câmara de Notícias